quinta-feira, 26 de março de 2009

Plumas poéticas... Entrevista com Fabrício Carpinejar


Fabrício Carpinejar parece que respira, se alimenta, vive de poesia. Basta mandar um e-mail solicitando uma entrevista, como eu fiz, para ter uma amostra do universo do poeta: “É certo que vou responder. Vou escovar meus olhos em tuas palavras e logo volto carregado de plumas.” Uma simples correspondência on line vira poesia.
Realizei uma entrevista via e-mail com Fabro, como gosta de ser chamado, para a cadeira de Web Jornalismo, ele foi muito querido e atenciosamente respondeu, segundo o próprio, “com todo o amor”. Segue abaixo a entrevista na íntegra.


1 - Quando e como surgiu teu "eu" escritor?
Acho que surgiu o "ele" escritor.
A literatura me motiva a tomar a vida dos outros como se fosse minha.
É um pessoalismo altruísta, meio santo meio maldito: esvaziar-se de si. Sou o último a me ouvir.
Acredito que minha infância barulhenta de sinais me inspirou a deixar lentamente um testamento por escrito.
Ou pode ser meu modo de devolver todas as frutas que roubei de meus vizinhos.


2 - O que mais te inspira a escrever?
O que ninguém amou ou percebeu o suficiente. Literatura é dar valor ao que estava na garagem, no porão, no quartinho de tralhas, e convencer de sua importância para a casa.

3 - Em que momento (do dia, fase da vida, estado de espírito) tu consideras mais propício para escrever?
Manhã, família em alvoroço, eu me sinto tremendamente vivo com os atrasos para a escola dos meus filhos. Em seguida, bebo café com neblina. A neblina é meu açúcar. Uso duas colheres de neblina no expresso.
Ou bem de noite, quando seguro minhas mãos cansadas como um livro. Daí não vou fingir nada, só contar a verdade. O corpo não mente de madrugada.

4 - Em tuas crônicas, tanto no blog quanto em Canalha, aparecem muitas experiências pessoais. Normalmente, são situações por que tu realmente passou ou parte é criação associada à realidade?
São vidas reinventadas. Possíveis. Há uma emoção biográfica encharcando histórias imaginadas. Como escrevo é real, o que escrevo é criação.

5 - Quando tu relatas casos pessoais e cita outras pessoas, como quando fala dos teus amigo canalhas ou como no caso em que um vizinho teu reclamava do "pinga-pinga" do teu ar condicionado, estas pessoas não ficam brabas ou reclamam da exposição?
Quem entrou na minha vida, entrou também para dentro do livro. Não entendo o medo da exposição. Quem tem que ter medo da exposição é criminoso, não gente do bem. Aceitar nossas falhas e limites melhora o nosso humor. Ser processado por amor é o sonho de todo canalha.

6 - A que horas tu acorda? E que horas dorme?
Eu desperto 7h e durmo às 2h.

7 - Costuma ouvir música para escrever?
Não dá para ouvir música. Ela se infiltra nos textos tão poderosamente que passo a plagiar o ritmo. Não posso ser fiel a dois senhores: prefiro cuidar e ouvir o ritmo do texto, meu batimento cardíaco em cada tecla.

8 - No geral, que tipo de música tu gosta de ouvir? Cite algumas.
U-2, Stones, Nirvana, Radiohead, Tom Waits.

9 - O que te faz sorrir?
Quando meus filhos me imitam e eu - em seguida - me torno uma imitação deles.

10 - O que te faz chorar?
Incompreensão

11 - Se você não fosse você, quem gostaria de ser?
Ninguém, paguei minha personalidade à vista. Agora é me aceitar.

12 - Um livro que te marcou? Por que?
Cidades Invisíveis, de Italo Calvino. Toda mulher é uma cidade.

13 - Um filme que te marcou? Por quê?
O Campeão, de Franco Zefirelli, o primeiro que assisti. Meu pai recém havia saído de casa. Chorei num filme tudo o que um homem não chora toda a vida.

14 - Uma música que te marcou? Por quê?
Hurricane, de Bob Dylan. Pela sua capacidade de narrar e contagiar, por transmitir numa melodia a fúria alegre de uma luta de boxe.

15 - Se pudesse ser mulher por um dia, o que faria?
Ficaria o dia inteiro pensando o que um homem deseja e assim resolveria meus problemas.

16 - Uma qualidade sua?
Obsessão

17 - Um defeito seu?
Obsessão

18 - Uma característica essencial do Fabrício?
Amor incondicional - vou ao inferno para buscar o melhor buquê de fogo.

19 - Alguém que você admira?
Tarkovski, cineasta russo

20 - Alguém que você repudia?
Stalin.

quarta-feira, 4 de março de 2009

O mais próximo que cheguei das nuvens



Quando eu era criança e via algum avião passar longe, pequenininho, se escodendo entre as nuvens até sumir no horizonte, imaginava como deveria ser ver tudo lá de cima. Tudo que até então parecia grande, de repente, se transformando em uma minúscula maquete. As pessoas a se movimentar como formigunhas, os carros e casas como se fossem de brinquedo. E como deveria ser olhar pra cima lá de cima. Ver o céu, o sol e as nuvens tão de perto. Ah, como seriam as nuvens? O que mais me despertava a curiosidade era sua consistência: se parecia mais com algodão doce ou pelúcia, fofinha? Gostaria de poder tocá-las e descobrir. Além disso, havia o fato de poder voar. Acho que toda a criança um dia gostaria de desafiar seu próprio corpo e a tal da leia da gravidade e poder voar. Para quem não tem asas, uma das possibilidades de chegar mais próximo da sensação que deve sentir um pássaro, é o avião.


Viajei de avião pela primeira vez no último feriado de carnaval. Nem lembrava muito de meus pensamentos de criança sobre isso. A expectativa do momento era pela curiosidade do novo. Mas quando a aeronave decolou, reavivou-se minha imaginação de pequena. Lembrei de quando me imaginava lá em cima. Agora estava lá em cima. Enfim poder voar. Enfim poder ver tudo se distanciando e diminuindo lá embaixo. Enfim, conhecer as nuvens de perto. Claro que agora vi as coisas com algumas diferenças. Já sabia que as nuvens não são feitas nem de algodão doce e nem de pelúcia. Ao invés de maquetes, o que vi ao olhar para baixo foram mapas do Google (hehe). Apesar disso, minha sensação era como a de uma criança feliz ao realizar uma estrepolia de sua imaginação, de vencer o desafio de poder voar.



Quem dera todos os fatos da vida adulta, fossem da forma como idealizamos quando criança. Como andar de avião.

Acho que agora entendo teu fascínio por avião, Jamille!